Entrada pela frente ou por trás?

Settra aponta benefícios a longo prazo, mas usuários sinalizam muitas dificuldades. Tumulto e falta de paciência de motoristas são as principais reclamações

Cidade - 18/10/2010
http://www.jfhoje.com.br/2010/10/18/entrada-pela-frente-ou-por-tras

Até o dia 15 de dezembro, por força do Decreto Municipal n° 10.376, todos os veículos de transporte coletivo de Juiz de Fora deverão ter o fluxo de entrada e saída de passageiros completamente invertido. Segundo expectativa da Secretaria de Transportes e Trânsito (Settra), essa mudança estará concluída em tempo inferior, visto que o percentuatal atual atinge 50,5% (277 coletivos) da frota, com progressão para, até o final deste mês, chegar a 70%.

Não só de expectativas, mas, paralelas às modificações estruturais dos veículos, também há as mudanças culturais, visto que, ao contrário do que se possa imaginar, a inversão do fluxo atinge um costume da população existente há mais de 50 anos, quando os ônibus começaram a circular na cidade. A alteração nos coletivos teve início no dia 2 de agosto e, de acordo com a chefe do Departamento de Transporte Público da Settra, Andréa Júlia Gonzalez Santos, as mudanças vieram para beneficiar o usuário e os profissionais, seja na segurança ou na agilidade do serviço.

— Elas evitam os acidentes causados na descida dos ônibus, já que os passageiros saem pela porta de trás; a proximidade do motorista e trocador inibe assaltos; os dois profissionais podem ajudar os cadeirantes; com a eliminação do curral (local que antecede a passagem da roleta no modelo antigo), conforto, agilidade e número de cadeiras aumentaram — enumera. Até o momento não houve registros de nenhuma reclamação ou elogio no departamento.

Esses reflexos, elucida Andréa, serão vistos com mais clareza posteriormente, com a inversão de fluxo concluída e com o tempo, principalmente em relação à diminuição dos assaltos a coletivos. — Juiz de Fora não é pioneira na inversão. Essas vantagens são de outras cidades, mas, de fato, são um ganho real — destaca.
Cadastro de idosos

Outro benefício citado por Andréa que acompanha a inversão do fluxo é a aceitação pelo cartão do idoso. Se antes, as pessoas com idade superior a 65 anos, tinham o benefício de entrar pela porta da frente comprovando com o documento de identidade, hoje, o idoso também pode ter um cartão que assegura esse direito.

Segundo Andréa, o passe eletrônico agiliza esse processo e elimina a discriminação entre os usuários.

— O idoso tem mais essa opção. O cadastro é contínuo e não é obrigatório. É mais uma forma de acessar gratuitamente, além do documento de identidade.

Atualmente, quase 25 mil idosos já se cadastraram. A previsão na cidade chega a 55 mil, mas grande parte do esperado já foi feito em março e abril. O cadastro deve ser realizado na sede da Astransp, à Rua Espírito Santo, 296, de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, ou aos sábados, das 8h às 12h. É necessário apresentar documento de identidade, CPF e comprovante de residência.

O que acha o sindicato

Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Coletivo Urbano (Sinttro), José Pedro Franco Ribeiro, as mudanças estão funcionando, mas alguns pontos ainda não são ideais.

— Passageiros ainda entram e param antes da roleta, o que provoca um acúmulo de usuários, dificultando a saída dos idosos — ressalta.

Em relação aos assaltos, Ribeiro concorda que ainda é cedo para fazer uma avaliação, mas acredita que os índices vão diminuir, principalmente com a adoção do cartão eletrônico.

— Nós tínhamos a preocupação com o emprego dos trocadores, já que os motoristas poderiam fazer todo o trabalho — resume.

Outro avanço, segundo ele, recai na proximidade dos profissionais, que podem se ajudar mutuamente, como no caso dos cadeirantes.

População vê mais pontos negativos

A inversão do fluxo de passageiros não é vista com bons olhos pela população, principalmente os idosos. As maiores reclamações apontam para um tumulto muito gr ande na parte dianteira dos ônibus.

— Está muito complicado. Não consigo passar da roleta, às vezes. E quando passo, atrás não tem lugar para segurar, afirma a usuária Wanessa Cristina de Oliveira. Outro ponto destacado é a falta de paciência dos motoristas, que fecham a porta traseira antes do passageiro descer e, às vezes, param em uma distância em que a porta de descida fica fora do ponto.

A usuária Esmeraldina Faier, que utiliza o direito da porta dianteira, vê melhorias na inversão, mas aponta uma situação mais séria: a falta de apoio à sua filha que necessita do uso da porta para portadores de deficiência.

— Minha filha de 33 anos não usa cadeiras de roda, mas precisa de duas pessoas para se locomover. Vários motoristas não abrem. Até os passageiros já reclamaram — protesta. Nesse aspecto, não adianta a proximidade dos profissionais, como pontuaram Andréa Gonzales, da Settra, e Ribeiro, do Sinttro, se a consciência não sofre mudanças. Para Marcos Polônio, a inversão foi boa, com exceção do acúmulo de pessoas que ficam na frente e não passam pela roleta.

Para Vilma Maria Brito, a confusão é grande, principalmente para os idosos.

— As pessoas de idade têm que ficar na frente e a confusão é grande. Para descer fica muito difícil — explica.

Para vários motoristas, a inversão não trouxe muitas mudanças.

Tumulto nos pontos

Outra questão levantada por usuários e pelo presidente do Sinttro é a grande aglomeração de passageiros em determinados pontos de ônibus, o que impede a locomoção das pessoas ou atrapalha o estacionamento dos ônibus.

— A atenção deve ser maior nas baias. Do Bom Pastor até o Manoel Honório, principalmente no Parque Halfeld, os pontos são pequenos e cinco carros são o bastante para lotá-los nos horários de pico — afirma Ribeiro.

Sobre essa questão, o secretário de Transportes, Márcio Gomes Bastos, aponta melhorias para o próximo ano. Um projeto da pasta prevê alternativas para os pontos de parada dos ônibus, principalmente os da Avenida Rio Branco, onde o problema de superlotação é mais frequente, conforme argumenta Bastos.

— A primeira situação é a implantação de terminais. Com isso, o número de pessoas ficaria o mesmo nos pontos, mas o tempo de espera diminuiria. Se espero 20 minutos, esperaria apenas cinco — exemplifica. Essa alternativa depende do Tribunal de Contas do Estado, que segundo Bastos, congelou o processo licitatório em agosto de 2009.

O uso de terminais funcionaria da mesma maneira como o que já ocorreu em Juiz de Fora, com a Zona Norte. Conforme explica Bastos, os terminais se localizariam em diversos pontos, o que facilitaria o embarque dos passageiros para regiões próximas.

— Já impetramos três recursos no Tribunal e, num período de ano e dois meses, não sabemos se houve falha na licitação ou teremos que fazer outra.

A segunda alternativa será viável caso a primeira seja inviabilizada. — Nosso ‘plano B‘ é trabalhar na ampliação física dos pontos. Cada caso é um caso. Na Rio Branco, onde temos o grande gargalo, do ponto de vista urbanístico, queremos ampliar para um grande ponto de ônibus. No modelo atual, além da falta de segurança e desconforto, os ônibus ficam muito tempo parados — destaca. Estes estudos serão avaliados até o final do ano, com previsão de início de obras para 2011.